Vemo-nos por aí...

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Menos eu...

Atirar-me ao mundo das palavras sem resposta, no silêncio do meu espaço, num interior que não partilho, é um dos poucos momentos de total liberdade que ainda sinto. De puro prazer de sorrir para mim, à falta de rostos que o façam. Por isso, em dias como hoje, em que o tempo pouco permite, sinto-me menos eu por pouco poder dizer. Deixo, por respeito à consideração que tiveste em passar por aqui, mesmo que de fugida, um texto de Lord Byron. Menos eu, nada meu, mas muito melhor...


Encontro-me mais uma vez sobre as ondas, uma vez mais!
E erguem-se debaixo de mim as vagas como um corcel
que conhece o cavaleiro. Que o seu bramido seja bem-vindo!
Ah, que me guiem depressa, para qualquer lugar!
embora o mastro estremeça e se incline como um canavial
e as velas sejam impelidas, despedaçadas pelos ventos,
não posso deixar de prosseguir porque sou uma alga
arrancada das rochas que voga sobre a escuma do Oceano
para onde a arrastam as ondas e a respiração da tempestade.

Depois dos meus dias de paixão, alegria ou dor,
talvez a minha harpa, a minha alma se tenha quebrado
e delas nasça um áspero som; pode ser que inutilmente
procure cantar uma vez mais como outrora cantei;
embora seja tristes acordes, permanecer-lhes-ei fiel
desde que me arranquem a este penoso sonho
dum sofrimento e alegria egoístas, que espalham
à minha volta o esquecimento: e este tema
embora aos outros o não seja. tornar-se-à grato para mim.

Aquele que envelheceu neste mundo de provações
com trabalhos, não com anos, e ao mais íntimo da vida
desceu para que nada o surpreenda, e a quem o amor,
o desgosto, o renome, a ambição e as rivalidades
não vêm despedaçar o coração com um punhal acerado
duma silenciosa e viva dor - poderá dizer
por que o pensamento busca refúgio em antros solitários,
mas cheios de aéreas imagens, de antigas formas
sempre intactas, no refúgio assombrado da alma.

É para criar e, ao criarmos, viver
uma existência masi intensa, que às nossas visões
entregamos uma forma, recebendo ao doá-la
a vida que imaginamos, tal como o faço agora
Que sou eu? Nada! Todavia és diferente, tu, alma
do meu pensamento, com quem atravesso a terra
- invisível, mas vigilante -, enquanto me confundo
na luz do teu espírito, partilhando a tua origem
e sentindo as mesmas emoções vazias e perturbadas.

Ah, preciso de apalcar a minha loucura...Longamente
me detive em sombrios pensamentos, e o meu cérebro,
com o seu próprio redemoinho tão febril e exausto,
transformou-se num abismo de imaginação e chamas:
assim não tendo na juventude aprendido a vencer o coração,
ficaram as minhas fontes de vida envenenadas...
Ah, como é tarde! Embora me tenha trnsformado, sou ainda
o mesmo para aceitar a dor de tudo o que o tempo não apaga
e alimentar-me de frutos amargos, sem acusar o Destino.

[Encontro-me uma vez mais sobre as ondas, Lord Byron, Poesia Romântica Inglesa]

Sem comentários: