Vemo-nos por aí...

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Eppur si muove

O mundo não para de girar e coisas fantásticas continuam a acontecer. A circularidade da existência é, de facto, fantástica. Talvez hoje, mais do que nunca, faça sentido a letra da Fortuna e "então agora sem demora puxe essa corda vibrante"...

Porque não hoje

Hoje não trocamos mais palavras do que as subentendidas nos olhares que cruzamos. Hoje contemplamos apenas o mundo. E apenas não é pouco! Hoje lagartamos ao sol, lado a lado, e acompanhamos Apolo ao longo do horizonte. Hoje, que dia fantástico está...

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Sobrevivendo por aí

Hoje partilho contigo, leitor desperto para causas perdidas, um poema de Garrett. O tema é tão antigo como o mundo, ou talvez mais. Porém, como bem sabes, é sempre pertinente, qualquer que seja a lua. Se amas ou se não amas, se sofres ou não sofres, se choras ou sorris. A transversalidade tem esta coisa fantástica de tocar a todos, qualquer que seja a fase lunar em que se acham. Poderás ver lua cheia e brilhante, sorrindo para ti. Poderás ver lua nova, de negro vestida, escondida de ti. Poderás ver a esperança em quarto-crescente ou pressentir o fim em quarto-minguante. Estejas onde estiveres, este nunca te será um tema indiferente.

Este inferno de amar - como eu amo!-
Quem mo pôs n'alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói-
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há-de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez... - foi um sonho -
Em que paz tão serana dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar...
Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei... dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei...


Se estiveres simplesmente por aí, descansa, que a tua hora chegará. Por enquanto, e porque viver pode não te parecer possível, sobrevive até nos encontrarmos por aí…

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Solidariamente Só

Sei-me por aí. Vejo-me por aí. Sinto-me por aí. E por aí andarei, como tenho andado em séculos de solidária solidão.
Solidão porque minha e só minha, quando o mundo me continua a parecer estranho e distante. Solidão minha e só minha, quando leio nos outros aquilo que os próprias não conseguem. Solidão minha e só minha, quando sei que na terra plana me condeno aos cantos sombrios do espaço e contemplo, ao longe, maravilhado, as luzes brilhantes. Como se vêem melhor, aqui, na sombra, e como continuam tão inacessíveis hoje como ontem e amanhã.
Solidária porque partilhada pelas páginas onde me perco, pela poesia onde me escondo, pelas paisagens que contemplo, pelas lágrimas que, em silêncio escondido, tenho vontade de chorar.
Solidariamente só porque o amor é isso mesmo. Essa esperança inocente de quem te sabe estar por aí. Esse sorriso esquecido de quem te vê por aí. Esse suspiro perdido de quem te sente por aí. Essa lágrima caída de quem te quer acreditar por aí.
Solidariamente só esperando algures no caminho dividir a solidão e, enfim, viver novamente só. Só para ti.

domingo, 27 de janeiro de 2008

Eternamente caminhando

Caminho trilhado a passo certo. Esta poderia ser a suma do percurso de um livro de viagens incríveis. Do meu livro de aventuras. Naturalmente que aqui se cruzam outras histórias e as aventuras de outras gentes. Confunde-se criação e criador, porque os caminhos são isso mesmo – a mistura de origens diferentes num todo em que nos reconhecemos.
Sei no que pensas e sei que me repetirás a frase que todos dizem com a indiferença das sentenças banais e das trivialidades assumidas, ‘no man is an island’. O risco que se corre quando os pensamentos profundos dos filósofos se vulgarizam, é este, perder-se o sentido e o contexto em que surgiram. Eu sou uma ilha e tenho a certeza de que Teilhard de Chardin também o achava. Na realidade, leitor cansado, aquela sentença que todos citam continua num texto belíssimo, onde podes ler a seguir ‘entire of itself’. ‘No man is an island, entire of istself’. Que diferança!
Sou uma ilha onde aportam barcos. E, claro, perguntas tu, onde está o farol para que te encontre? Não está. Para que haveria de o acender? Para quem haveria de o acender? Porque não permanecerei eu uma ilha isolada em mim? A resposta é simples, porque sendo ilha, também sou barco. Já sei, sempre as dualidades.
Sou barco à procura de farol e assusta-me não encontrar uma ilha onde aportar ou, quem sabe, ancorar. Nesta busca errante em que sou dois, em que sou ilha e barco, espero encontrar-me e enfim, recomeçar…
Caminho trilhado a passo certo, de mão dada. Esta poderá ser a nova suma de um novo percurso de um novo capítulo de um livro de viagens incríveis. Do nosso livro de aventuras onde sou um dos personagens. Naturalmente que aqui se cruzarão outras histórias e outras gentes. Confundir-se-á ilha e barco, porque a viagem será isso mesmo – a transfiguração constante entre barco e ilha onde, com muito cuidado, manteremos acesos dois faróis.

sábado, 26 de janeiro de 2008

Diz-me se não chegar...

Subiria montanhas, nadaria mares, atravessaria continentes. Lutaria contra os quarenta ladrões, lutaria contra o Ali Babá. Enfrentaria o amigo Quixote e o seu fiel escudeiro. Mataria sete de uma vez. Prenderia o Robin dos Bosques e o Zé do Telhado. Destronaria a Rainha de Copas e o Lord Farquaad. Caçaria todas as Bruxas Más e o Lobo Mau também.
Se tudo isto não bastasse para chegar a ti e te fazer sorrir, ainda te levaria uma flor…


quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Moinhos de vento...

Irmanado contigo, Quixote amigo, porque também eu vejo gigantes. Preparo minha lança e parto à aventura. Como tu, estou disposto a suportar a dor, a ignorar o riso das gentes, a enfrentar o mundo. Como tu, quero ultrapassar adversidades, quero desconhecer perigos. Como tu, também eu procuro o lugar-amor.

Quase-irmanado contigo, Quixote amigo, porque aos avisos prudentes do coração vacilo e vejo moinhos. Tenho agora à frente as suas pás, girando com o vento e, mesmo sabendo que são gigantes escondidos, hesito em lutar. Sim, eu sei, homem de pouca fé! Ah, como também gostava de ver gigantes e só gigantes e, mesmo vencido, não desistir.

Apenas sinto o vento no rosto, Quixote amigo, e contemplo ao longe os lugares onde não estarei. Ao meu lado, um grande livro de aventuras onde, sem limites, sou tu.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Pela noite dentro te espero

Já foste. Já baixaste ao Olimpo das estrelas, meu astro-rei. Mesmo não te tendo devolvido o sorriso pela manhã, cuidaste de mim. Agora, recolho-me tranquilo, depois de ter dito adeus e de esperar, impaciente, que regresses novamente. Amanhã, ao contrário de hoje, o primeiro sorriso será meu…

Humildemente me confesso


Sol brilhante que te levantas no horizonte distante quando, cansada, a alta lua se esconde. Tranquila indiferança a tua, raiando pela manhã. Ignoras o que sinto e o que na tua ausência se passou. Esperas de mim o sorriso leve que sempre te devolvo, mas hoje não. Hoje não!
Hoje olho perdidamente para lá de ti no canto escuro em que me encontro. Hoje sei que não nasceste para mim e, por isso, humildemente me confesso.


Aqui, diante de mim,
eu, pecador, me confesso
de ser assim como sou.
Me confesso o bom e o mau
que vão em leme da nau
nesta deriva em que vou.

Me confesso
possesso
das virtudes teologais,
que são três,
e dos pecados mortais,
que são sete,
quando a terra não repete
que são mais.

Me confesso
o dono das minhas horas.
O das facadas cegas e raivosas,
e o das ternuras lúcidas e mansas.
E de ser de qualquer modo
andanças
do mesmo todo.

Me confesso de ser charco
e luar de charco, à mistura.
De ser a corda do arco
que atira setas acima
e abaixo da minha altura.

Me confesso de ser tudo
que possa nascer em mim.
De ter raízes no chão
desta minha condição.
Me confesso de Abel e de Caim.

Me confesso de ser Homem.
De ser um anjo caído
do tal céu que Deus governa;
de ser um monstro saído
do buraco mais fundo da caverna.

Me confesso de ser eu.
Eu, tal e qual como vim
para dizer que sou eu
aqui, diante de mim!

(in Livro das Horas, Miguel Torga)


Como espero sol alto, que na tua descida, nova descida sempre igual, receba o perdão que preciso e a cumplicidade que não sinto. E amanhã, amanhã nascerás outras vez…

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Todo o tempo do mundo

A vida corre certa, tranquila, sem mais delongas do que encontra o mais banal dos seres ou, avisas-me tu amigo atento, dos quase-seres. Em mim me escondi um dia, vagueando nas mais fundas paragens do espírito, certo de não mais me achar. Quando assim, mantenho o passo discreto das horas mansas, dissolvido nas multidões que não conheço, ignorando mundos estranhos e acreditando que a vida é aqui, onde estou.
Que mais deveria querer, não é? Encontrar-me em ti, amor ausente que desperto. Não corro senão apenas quando me chamas ou te julgo ver ao longe. Não me sei perdido, senão quando te sinto ser, te sinto estar.
Enquanto não conheço outra senda que não eu, aguardo, sereno, que me apontes novas idas. Angustiado? Não, de maneira nenhuma. Em mim nunca me perco e para ti, sim, para ti, tenho todo o tempo do mundo…


Farol...



Farol que te escondes a cada instante. Que me fazes crer que o chão é aí, que a vida é aí, que o amor é aí.
Farol que te apagas com o dia e me fazes crer, torre alta, que o mar imenso não tem fim.
Farol que iluminas o que não vês, que me guias e me chamas e me tomas por marujo cansado, perdido, sem rumo nem destino.
Ah, Farol! Como receio aportar na tua esteira, como receio atracar no teu cais, como receio o teu idílio.
No tempo que quase-fui, soltei amarras de mim, e encontrado me espraiei no mar imenso em que me perdi. Fui meu. Fui eu. Fui assim.
Tenho medo! Anda comigo...

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Olhando pelo ombro...

Para ti que procuras na noite o que não encontras.
Para ti, que continuas o caminho que não conheces
e que vês ao fundo, diante de ti,
a luz que ficou para trás...

Para ti que procuras um mundo que não perdeste,
de caminhos que não escolheste,
de sorrisos que não sorriste,
de amores que nunca sofreste…

Para ti, que olhas em frente
não há mundos esquecidos
não há caminhos errados
não há percursos perdidos.

Porque não olhas para o lado?


Por onde andas, que não te encontro por aí?

Como procuras ser diferente, amigo. Como dizes diferente. Como escreveres diferente, cantas diferente, ouves diferente. Nada há de especial nisso. Em nada te superas quando dizes coisas novas, quando escreves coisas novas, quando cantas coisas novas, quando ouves coisas novas.
E, perguntas tu, na tranquila sabedoria que sempre te reconheço, como se cria então a novidade? Amigo, a novidade surge quando olhas para a lua, quando vês o mar, quando cheiras uma flor, quando sentes uma planície, quando escalas uma montanha ou ouves o eco da noite. Assim te apercebes ser único e diferente. Ninguém olha com os meus olhos para o mundo e ninguém vê o seu mundo sempre da mesma forma.
Original a minha visão? De maneira nenhuma. Já Heraclitus te tinha dito, mas com certeza o esqueceste. "Nenhum homem se banha no mesmo rio duas vezes". Estou certo que também ele o ouviu de alguém...

domingo, 20 de janeiro de 2008

Das cinzas...

Das cinzas para o mundo. Que mundo? Perguntas tu leitor atento destas paragens. Existe resposta? Talvez. Queremos resposta? Pressuponho que não, que se torne desnecessária. Como tem vida própria a pergunta. Como se ancora em si mesma. Como a sua maior força depende do silêncio da resposta ou, se preferires caro amigo, da resposta de silêncio.
Sempre foi desse silêncio que o mundo nasceu. Foi nesse silêncio que a palavra nasceu. Foi nesse silêncio que a Humanidade nasceu. E no meio de tanto ruído, renasci eu. Das cinzas de outros mundos cresce agora novo ser. Quase-Homem. Quase-imperfeito. Quase-nascido. Quasimodo.
E, quase nascido, sigo caminho. Por onde? Perguntas tu novamente, adivinhando a resposta. Por aí. Não é, afinal, a melhor forma de nos cruzarmos?