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quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Formigar

Procuramos momentos de transcendente leveza, do forte bater do coração, essa explosão atómica dos sentidos, de excitação à flor da pele, de arrepios de felicidade. Procuramos sempre esse arrebatamento profundo de amor, onde se concentra toda a energia do universo, como se tudo o mais deixasse por momentos de existir. Arriscaríamos praticamente tudo por um desses segundos de magia onde, de um beijo, nasce o tal bosão de Higgs, essa "Partícula de Deus" que uns e outros insistem em procurar no lugar errado. Sim, é isto que procuramos ou, pelo menos, é com isto que sonhamos. Talvez por isso mesmo sintamos todos os outros momentos, a maioria deles aliás, em que os fotões se perdem no espaço vazio, como estrelas cadentes que morrem pouco depois de nascer, sem nada que as eternize, que não a nossa memoria daquele risquinho no céu.
O que todos esquecemos muitas vezes é que o amor é muito, muito mais do que esta aparente transformação de energia. É sobretudo formigar. Essa labuta constante na linha contínua do tempo. Essa teia de carreiros que se cruzam e descruzam a toda a hora, onde altos e baixos, fotões em fuga ou bosões de Higgs, acontecem a cada instante.
É formigar pois. É reconstruir com paciência o que o dilúvio arrasou sem piedade, mas é também caminhar, abraçado, com os pés descalços na areia. Sigo caminho, tentando sentir sem pensar, porque, como dizia Caeiro, “há metafísica suficiente em não pensar em nada”. Fico-me por esta, enquanto formigo.

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