Vemo-nos por aí...

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Desculpa

Desculpa se começa a germinar em mim, ainda que muito levemente, a pequena semente. A ti que me persegues nos pensamentos que quero evitar, que não quero ter, que não quero sentir. Desculpa se te constranjo com as palavras soltas, mas sentidas, que vou lançando por aqui e por aí. Desculpa se ultrapassei os limites da afabilidade, a partir da qual tudo é ousadia. Ultrapassei-me a mim, sei-o bem. Fui menos reservado do que costumo ser, mas menos temerário do que gostaria. Tentei criar um equilíbrio entre o desejo de velocidade do sentimento e a prudentíssima calma da racionalidade. Percebo agora, mais pela tua ausência do que pela minha lucidez, que não fui capaz. Que vi em cada sinal o que não deveria mas quis ver. Que li em cada palavra o que não escreveste. Que pensei para lá de cada partilha o que nunca lá esteve.
Continuo ainda assim a sorrir para ti. Em nada erraste ou te ultrapassaste. Porventura até me tenhas mostrado mais do que fui capaz de ver. Sinto-me agora um pouco mais pesado. Sempre me soube e me quis iludir com o que sabiam ser apenas ilusões. Inocência minha, desculpa.
Como percebo agora que a lua não é inocente, que o sol não é inocente, que a noite não é inocente. O que vi foi apenas um reflexo do meu olhar. Esperando que passe, tentarei secar a semente e guardá-la-ei para outra sementeira. Se não a houver, permanecerá apenas mais um objecto do meu baú das recordações.
Talvez mereçamos os dois algum recolhimento, embora a minha vontade seja ir atrás de ti. Permanecerei por aqui, à tua espera, em silêncio a partir de agora…

Em que língua se diz, em que nação,
Em que outra humanidade se aprendeu
A palavra que ordene a confusão
Que neste remoinho se teceu?
Que murmúrio de vento, que dourados
Cantos de ave pousada em altos ramos
Dirão, em som, as coisas que, calados,
No silêncio dos olhos confessamos?
(Saramago, 1999)
[Como apesar de tudo ainda sonho...]

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